domingo, dezembro 16, 2007

UMA CRÔNICA.... Significados ou Liberdade!

POR QUE NÃO ?

Fragmentos Introdutórios

Malas nas costas (literalmente), coração aos pulos - tum, tum, tum - calafrios (espécie de frios-quentes), medo e desejo se misturando cada vez mais....

Dez dias de insônia. Olhares que se cruzaram sem quaisquer compromisso de concretização de uma história.

Uma ciranda, sedução, jogo, dois corpos próximos ao som de alguma coisa que acontece no meu coração entre a Ipiranga e a São João, onde se localiza a Viação Aérea de São Paulo. Destino? Maceió.

Boa Viagem (RE)...


Maceió, 13 de outubro de 2000 - Lua Cheia

Silêncio interior. Barulho de carros, pedestres, buzinas. Ouve-se passos que se destacam dos demais pelas especificidades de seus anseios.....
UMA PRAÇA. Praça do Centenário.
Ela, numa ponta da praça, indumentária: calça tipo cigarrete preta, blusinha branca e sandálias, nas costas uma mochila que parecia conter os anseios do mundo, peso. Ele, surge de uma outra ponta, calça preta, blusa bege e sapatos. Nas costas? Uma mochila também, menor do que a dela, porém passível de abrigar anseios..... Nas mãos uma garrafa d'agua.
Pronto! Era disso que ambos precisavam, ÁGUA, muita água...Água pra acalmar a ansiedade, a taquicardia, para apagar o calor que tomava conta de seus corpos e para produzir salivas, salivas para as próximas palavras que diriam um ao outro.

- Oi, eu vim! Ela estava por demais nervosa, tentava disfarçar, mas, imediatamente se traiu, derrubou a preciosidade daquela garrafa de água, tão repleta de significados...

Respiraram fundo.Ele passou a mão sobre o rosto dela e agora que já não tinham mais água, começaram a andar.
Na bem da verdade nenhum dos dois sabiam ao certo o que estavam fazendo ali, lado a lado. Haviam trocado tantas expectativas, saudades, se desejado mutuamente e no entanto nem sabiam quem eram, ou será que sabiam?Talvez isso nem importasse. E sairam a andar, andar pelas ruas da cidade, dentre pessoas que, no fundo de suas almas, naquele momento nem existiam .
Caminhavam lado a lado e as vezes, afobadamente, seus corpos se esbarravam sem a menor intimidade. Agora não se tratavam mais de corpos virtuais, tinham forma, volume, peso, cor, temperatura e até gosto e cheiro, embora os dois últimos eles ainda não sabiam. Corpos que guardavam dentro de si os desejos do mundo e os medos do mundo também.
Um ônibus, UFA, agora eles já podiam sentar-se próximos, como nunca haviam sentados, já tinham dado muitas voltas em círculo e estavam prontos para começar a se olhar, se ver (3ª categoria), se descobrir... Momento de constatações e surpresas: olhar as bocas, os olhos, os sorrisos, os jeitos.... Enfim, começaram a se REDESCOBRIR!
E a viagem começou, ou melhor, continuou....
VIAGEM (S.f. ato de ir de um a outro lugar relativamente afastado), este seria um verbete bastante apropriado para definir tal situação. Se tratava de um afastamento no tempo, no espaço, na órbita e na imaginação que, agora, migrava de IMAGEM para AÇÃO. Uma viagem que transcendia duas vidas fincadas em mundos seccionados e que por opções irracionalmente concretas romperam a barreira do monótono cotidiano e se permitiram acreditar em sua intuições.
Estrada reta, caminhos sinuosos...Belo dia ensolarado, sereias sobre o mar. Dois olhares timidamente permitindo um encontro... Era como se pedissem licença um pro outro: Posso penetrar no seu mundo? E, contraditoriamente,  ao mesmo tempo em que buscavam um intercâmbio entre seus mundos, este momento só existia porque haviam deixado seus próprios mundos.
Ai... Primeira parada, agora começavam a sentir-se mais soltos, mais leves, como se trocassem seus sapatos e sandálias por confortáveis chinelos, como se molhassem os pés no mar, como se simplesmente contemplassem crianças brincando de quebrar potes....
Ali já sabiam que aquela história, como quase todas as histórias do mundo, não era repleta de verdades, tinha mentiras necessárias para torná-la verdadeira... e ela telefonou. Se viram verdadeiros nas suas mentiras e mentirosos nas suas verdades!
Outro carro, de volta a estrada... A estrada que os levavam deus sabe pra onde. Eles também não sabiam qual seria o caminho escolhido ou quais seriam os caminhos a escolher, a percorrer e a regressar. Agora o carro era menor, bem menor, mais confortável.... como se aos poucos eles fossem chegando cada vez mais perto do espaço interior um do outro, aos poucos, bem aos pouquinhos, iam escrevendo está história num papiro branco.
Dúvidas ? TODAS DO MUNDO. Desde sempre, desde que seus olhos se cruzaram numa ciranda ou seus corpos se conheceram numa dança... Pra onde ir ? Não sabiam nem ao certo se deveriam ir, quanto menos pra onde!
E voltaram a andar. Andaram, andaram, suaram. Ela era bem mais leve do que quando se encontraram na Praça, pois a mochila que guardava o peso dos seus anseios estava sobre as costas dele...
Se cansaram? Sim, cansaram. Mas ali, naquele momento, já se gostavam e a Barra de Santo Antônio respirava tranquila porque via-os bem.
Era uma história tão sem nexo, tão aparentemente sem lógica, afinal desejo, paixão são coisas equivocadamente apresentáveis sem lógica, que parecia ser preciso ainda mais.... Transgredir o continente, atravessar a água (que é a mais pura representação dos sentimentos) e atracar num outro território, num outro mundo, numa outra tela, como num filme onde a LUA se encontrava no camarim, se despindo para que na sua mais nua beleza iluminasse e brindasse aquele momento ímpar, quando assim eles a solicitassem.
Era uma ilha, no imaginário popular símbolo do isolamento - Quem você levaria para uma Ilha deserta?-, e de repente o destino lhes jogou ali. Nela dois mundos estranhos foram convergidos pra uma história em comum. Uma história que a cada momento colecionava mais dados, mais detalhes, mais imagens...Imagens como a daquela canoa que os ligara aquele outro mundo.

E novamente, saíram  a andar.... Poxa, como andaram.... Andavam há dez dias sem nem perceber!Seus corpos estavam cansados, pediam, suplicavam, por aconchego, repouso, banho, sossego....... e encontraram!Demorou, mas enfim, encontraram. Era um casebre....Um gracioso casebre que agora abrigara seus corpos e seus pertences... Um casebre que sabiamente impedia a visão da paisagem dos fundos, aquela que representara o dia a dia, o previsível, o estático e, ao mesmo tempo, AMPLIAVA, ABRIA, ESCANCARAVA o cenário da janela da frente....Que pena, mas somente os dois, ELE e ELA, puderam conhecer a paisagem da frente!

Bem, agora já não tinham mais malas nas costas e suas antenas telefônicas estavam temporariamente desligadas do mundo. Seus corpos eram, jaz, mais leves, mais limpos....Já haviam olhado pra si, olhado entre si e olhado ao redor. Escutado as palavras do mar e contemplado a rara beleza da Lua. ENTÃO, com a coragem que somente os valentes neurônios embebecidos no álcool ousam alcançar, lá estavam eles, finalmente prontos. Prontos para se tocar! E se tocaram... como se tocaram!
É, ela estava lá, de testemunha! Quem???????????????? A LUA!
Estava CHEIA, tão cheia.... cheia de orgulho! Orgulho porque na história da humanidade foram poucas, pouquíssimas as vezes em que ela pode presenciar tamanha insubmissão. Onde duas pessoas inconsequentemente "arrancaram" gravatas, paletós, vestidos longos, regras, conveniências, tempo, lógica, espaço e medo SIMPLESMENTE pra se olhar e se tocar.
SE OLHAR e SE TOCAR.... algo que parece tão pouco aos olhos de muitos!

AH, a Lua aplaudiu e o Mar se embriagou!
Para Lua e o Mar, enquanto compartilhavam e contemplavam aqueles instantes, nem perceberam ou se lembraram do quanto eram espacialmente distantes!

Lua e Mar, lado a lado, metaforicamente como Ela e Ele, faraway, so close...

E enquanto viveram, Ela e Ele, esta história em comum, foram aprendendo um pouco mais sobre as contradições, os paradoxos, as metáforas, enfim, as figuras de linguagens do mundo...

"E pensar que tudo começou a partir de uma pergunta: "Por que não?"
A pergunta mais perigosa que existe, a mais subversiva.
Por que não, se eu quero sim!
Não se perguntem nunca, não se perguntem "por que não?". A MENOS QUE VOCÊS QUEIRAM SIM!"

out/2000